Nós, delegadas e delegados da categoria de trabalhadores e trabalhadoras domésticas do 11º Congresso da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e no Serviço (Contracs), reunidos em Guarulhos-SP, de 20 a 23 de setembro de 2023, com o tema ‘Reconstruindo o Brasil’, manifestamos nosso repúdio às recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Superior Tribunal Federal (STF) que determinaram a divulgação do endereço da instituição em que Sônia Maria de Jesus estava sob proteção. Para que a família, que responde a processo por prática de trabalho escravo, pudesse visitá-la e convencê-la à retornar para a residência da família de Jorge Luiz de Borba, desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, de onde foi resgatada da condição de trabalho doméstico escravo.
Sônia, mulher negra e com deficiência (surda), foi encontrada em ação fiscal do Grupo Especial de Fiscalização Móvel coordenada pela Auditoria Fiscal do Trabalho, realizada em junho de 2023, em Florianópolis. Sonia trabalha para Jorge Luiz de Borba e sua família aproximadamente há 40 anos, sendo privada de convívio com sua família biológica, convívio social, educação, saúde e bem-estar. E sem trabalho digno e decente.
Provável vítima também de tráfico de pessoas, Sônia, desde os 9 anos, exercia tarefas domésticas para a família sem receber salário, sem direitos trabalhistas. Sônia não pode ser tida como membro da família do desembargador, pois não foi à escola, não comia à mesa e não usufruía de viagens da família.
As decisões dos tribunais superiores violam as normas internacionais e nacionais de proteção ao trabalho decente e de reconhecimento e valorização do trabalho doméstico. As decisões também constituem uma ameaça à atuação dos auditores fiscais do Trabalho e ao esforço dos sindicatos de trabalhadoras domésticas e da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas do Brasil (FENATRAD), que desde a década de 1990 denunciam a existência do trabalho doméstico escravo e clamam pela colaboração do Poder Judiciário para garantir assistência no resgate e no pós resgate com segurança e sigilo absoluto, a reparação às vítimas e à devida responsabilização das pessoas e famílias que exploram o trabalho doméstico escravo no Brasil.
Por tudo isso e por Sônia Maria de Jesus merecer justiça e reparação é que repudiamos as recentes decisões do STJ e STF e clamamos para que o colegiado desses tribunais reveja sua decisão pautado na normativa protetiva dos direitos humanos e do direito ao trabalho decente.
Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (FENATRAD)