A Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (FENATRAD) vai promover, nesta quinta-feira (16), às 18h, uma live sobre “Trabalho Análogo à Escravidão e Cárcere Privado de Trabalhadoras Domésticas em pleno século XXI”. A transmissão será pelo Facebook da entidade @fenatrad.
Participam da live, Luiza Batista, presidenta da FENATRAD; Creuza Oliveira, presidenta do SINDOMÉSTICO/BA; Guadalupe Louro Turos Couto, procuradora do Trabalho no Rio de Janeiro; Maria Manuella Brito Gedeon, procuradora do Trabalho em Vitória da Conquista (Bahia) e Martin Hahn, diretor do Escritório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil. O debate será mediado pelo jornalista e assessor de Comunicação da FENATRAD, Pedro Castro.
Nas últimas semanas, diversas trabalhadoras domésticas denunciaram as práticas ilegais de trabalho análogo à escravidão e cárcere privado. Um dos casos que ganhou destaque na mídia nacional foi o da babá Raiana Ribeiro da Silva, 25 anos, que no dia 25 de agosto, em Salvador, se jogou do terceiro andar de um prédio, para fugir da patroa que, segundo a jovem, a agredia e a mantinha em cárcere privado. A babá sobreviveu à queda, mas sofreu uma fratura no pé.
Dias depois, uma câmera instalada na casa da empregadora flagrou as agressões sofridas por Raiana. As imagens mostram que a babá recebeu socos, pontapés, puxões de cabelo, e chegou a desmaiar no local.
A repercussão do caso resultou em denúncia de outras trabalhadoras domésticas contra a empregadora Melina Esteves.
“No momento de pandemia, que já prejudica a categoria das trabalhadoras domésticas, ainda encaramos esta situação, em pleno século XXI. Muitas trabalhadoras vivendo em cárcere privados e trabalho análogo à escravidão, violência física, como infelizmente aconteceu com a Raiana. Esses empregadores confiam na impunidade e no isolamento que a trabalhadora doméstica vive no local de trabalho. O advogado de Melina Esteves já está alegando que ela tem problemas psicológicos, mas esses problemas só acontecem quando ela agride pessoas da classe dominada hierarquicamente”, disse Luiza Batista, presidenta da FENATRAD.
Luiza Batista ressalta a necessidade da flexibilização da inviolabilidade do lar para a realização de investigações. “Porque a impunidade é o que estimula esses crimes”, frisou.
Creuza Oliveira, presidenta do Sindoméstico/Ba, afirma que depois de mais de 150 anos depois da Abolição da Escravatura, e em pleno século XXI, crimes de trabalho escravo estão acontecendo no Brasil.
“Nos preocupa como ainda nos dias de hoje esses casos venham acontecendo. Muitos casos ficam impunes. Alguns patrões têm tanta certeza da impunidade que continuam praticando os crimes. O caso de Raiana é terrível. A pessoa tem que atentar contra a sua vida para se livrar de uma situação de violência dentro do âmbito do trabalho”, disse.
Ela acrescenta ainda que “a FENATRAD tem tido uma luta em nível nacional e internacional para combater o tráfico de pessoas para o trabalho doméstico. E outra luta é essa contra o trabalho análogo à escravidão, não só no Brasil, como em todo o mundo. Sabemos que aqui no Brasil, a partir da luta da FENATRAD, começou então a se discutir sobre a fiscalização no local de trabalho. Os auditores fiscais estão assumindo mais essa questão. Para isso, precisa-se de denúncia, pois eles só podem fiscalizar a partir disso. Daí vão até o local para verificar a situação e resgatam a trabalhadora”, afirmou Creuza Oliveira.
Demais casos
Este ano, em Salvador, mais duas trabalhadoras domésticas foram resgatadas do regime de escravidão doméstica. As duas foram levadas para uma casa de acolhimento da Prefeitura de Salvador, que recebe mulheres vítimas de violência doméstica e de outros crimes e que precisam de acompanhamento de psicólogas e assistentes sociais.
Outro caso ocorreu em São Paulo. Uma trabalhadora doméstica foi resgatada de condições análogas à escravidão em São José dos Campos, em operação conjunta do Ministério Público do Trabalho (MPT), Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) e Polícia Federal (PF).
O combate ao trabalho escravo no Brasil ganhou força com a criação do grupo móvel da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, do Governo Federal. O grupo trabalha em conjunto com o Ministério Público do Trabalho e a Defensoria Pública da União.
Desde 1995, a força tarefa já resgatou 56 mil trabalhadores em condição análoga à escravidão, a maioria na zona rural. Mas só em 2017 ocorreram os primeiros resgates de trabalhadoras domésticas.
No fim de novembro de 2020, uma ação libertou Madalena Gordiano. Aos 8 anos de idade ela passou a servir uma família, em Minas Gerais, como se fosse uma empregada doméstica. Dentro da casa ela tinha muitos deveres e nenhum direito. Foram 38 anos assim.
Madalena se transformou no rosto mais conhecido da luta contra o trabalho escravo doméstico no Brasil. O caso dela repercutiu na imprensa do mundo todo. Depois que a história de Madalena foi divulgada, só nos primeiros seis meses deste ano 15 trabalhadoras foram libertadas, entre elas Leda e Luzia.
Números
Segundo a Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), desde sua oficialização, em 1995, até 2020, já foram registrados 55.712 casos de trabalhadores em condições análogas à escravidão no país. Destes, 942 casos foram registrados em 2020.
Números mais recentes da SIT, coletados entre 2016 e 2018, mostram que 82% dos resgatados neste perído eram negros. Além disso, dados do Programa Seguro-Desemprego, registrados entre 2003 e 2018, indicam que 70% deles são analfabetos ou não concluíram nem o 5º ano do Ensino Fundamental. Já as mulheres, que representam apenas 5%, geralmente são resgatadas nas cidades, sendo a indústria têxtil uma das principais responsáveis pela prática.
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Com informações do G1.